A REGRA É VENDER



O modo de vida dos cidadãos de todas as classes em diversos países de economia globalizada parece que atinge um impasse crucial. Nós brasileiros também estamos bifurcados entre a cruz e a espada. Crucial é o condicionamento da escolha entre a bolsa vazia ou a mercadorização da vida! A imperiosa imposição do capital para a produção e criação de tudo, ou quase tudo. Coisas outrora que independiam do “vil metal” para existirem passaram a fazer parte do ritual da mercadoria e transação. Mercado, mercador, mercadoria, esse é o triângulo “amoroso” da sociedade capitalista. Paixão e fé, promessa e ilusão, fidelidade e traição, crime e castigo... Vende-se de tudo, tudo é mercadoria. Certas igrejas prometem o céu se você depositar na crença-poupança. Os nossos desejos foram capturados pelos mecanismos midiáticos com o auxilio prestimoso da psicologia e hoje são escravos conformados e insaciáveis. O lado mais perverso do capitalismo é o de criar falsas necessidades, pois assim é a “natureza” do lucro e o individuo nem percebe sua inclusão nessa cadeia porque está convencido que a felicidade é a satisfação/insatisfação dos incontáveis desejos. O mercado discursa: Tudo tem um preço! O consumidor/mercador capta a mensagem e se entrega de corpo e alma na maratona da dívida socializada. Compre, pague, trapaceie se puder ou roube e mate se for preciso.


A arte e a cultura também estão contaminadas pelo vírus comercial/mercantil. O prejuízo é latente, enfraquecida a crítica social a estética não flui nem evolui e o cidadão fica ilhado e isolado por um mar de mediocridades. A mercadorização atinge os centros de produção de conteúdos midiáticos. Um jornalismo consumível, por exemplo, atrelado mais ao patrocinador do que ao público restringe a liberdade de opinião. Os artistas cada vez mais estão distanciados da complexidade do real. O intermediário, ou melhor, o “produtor” tomou as rédeas e é ele quem determina por e pra onde a banda deve tocar. As grandes corporações movimentam bilhões em publicidade e retransmissões de espetáculos e são elas que imputam uma castração da criatividade através de uma excessiva profissionalização dos meios. A conexão global nas comunicações colabora na construção dessa cultura híbrida, multifacetada e plural que a indústria de consumo derrama no mercado volátil. Há uma diversificada segmentação de gêneros e estilos e no caso da música pop de massa ela está basicamente voltada para o entretenimento. O público brasileiro tem fama de ter alma musical embora obtida fora de uma educação formal, erudita. No entanto essa alma não possui imunidade para baixa qualidade ou falsificações que o mercantilismo impõe na arte. O mercado só absorve o que pressupõe altos lucros e investe em artistas de "grife" ou nas novidades descartáveis. O verdadeiro artista deve livrar-se dessa camisa de força imposta pelos processos de massificação. A arte deve ser gratificante além de gratificada, não ter apenas o lucro na mira. Enfim, a banalização é a negação da democratização da cultura. Nesses conturbados caminhos da mercadorização, incorporo quixotescamente o “cavaleiro de triste figura” na luta contra os moinhos de vento, ergo a minha lança e canto alto e bom som: “Sonhar mais um sonho impossível/Lutar quando é fácil ceder/Vencer o inimigo invencível/Negar quando a regra é vender” Sonho Impossível- Chico Buarque e Rui Guerra em versão de Impossible Dream.


São Paulo/Abril/2014
Dorinho Marques
dorinhomarques@yahoo.com.br

                       







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